Estudante da UFBA fala sobre experiência de intercâmbio e estágio no MIT: "marcante"
13/10/2016 às 21:02
"Não hesite em escolher uma universidade que tenha interesse, mesmo que esta seja a primeira nos rankings da sua área", aconselha a jovem de 23 anos
Roseane dos Reis Silva é estudante de Física na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Entre os anos de 2014 e 2015, a jovem estudou na Universidade de Illinois em Urbana-Champaign e participou de um estágio de três meses no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT.
A estudante conseguiu realizar sua mobilidade acadêmica graças ao programa Ciências Sem Fronteiras, que já não está mais disponível para cursos de graduação. Para saber mais sobre as impressões de Roseane em sua viagem, o Intercâmbios Acadêmicos conversou com a jovem.
Como você decidiu que queria fazer um intercâmbio?
Eu queria estudar numa universidade americana desde o ensino médio. Como sempre tive interesse em ciência, tinha curiosidade em conhecer as melhores universidades na área. Ainda no ensino médio, tive alguns colegas aprovados em processos seletivos para estas universidades, e isto me estimulou a continuar pensando nisso.
Além disso, o modo como o Brasil vê a pesquisa científica tem impacto no que aprendemos na universidade. Queria mesmo colher tudo que um país com os maiores avanços científicos poderia oferecer. Então, quando o Ciência sem Fronteiras foi apresentado, vi a oportunidade para realizar esse sonho.
Como se deu o processo de decidir o país de destino?
Quando comecei a pensar num intercâmbio, logo comecei a estudar um outro idioma, que foi o inglês. Isso já limitou um pouco as opções de países que tinha para o intercâmbio. Como tinha interesse em pesquisas científicas em áreas específicas, pesquisei quais as universidades participantes do programa de intercâmbio pelo Ciência sem Fronteiras tinham pesquisas nas áreas que me interessavam. Em seguida, comparei os programas de graduação em Física destas universidades com a da UFBA. Nesse processo, restaram algumas universidades do Reino Unido e muitas outras dos Estados Unidos. Acabei escolhendo os Estados Unidos porque considerei que seria mais fácil entrar na faculdade que escolhi, pelo modo como a alocação para universidades era feita nesse pais.
A UFBA te auxiliou no processo?
Eu diria que a UFBA me auxiliou minimamente no que ela era obrigada através do coordenador do Ciência sem Fronteiras. No Instituto de Física, não obtive nenhuma ajuda. Na verdade, o processo foi até mais difícil do que devia ser por que meu coordenador simplesmente não concordava com estudantes fazendo intercâmbio. Era bem difícil entender porque dificultar o processo dessa forma.
Acho que a maior ajuda que recebi veio do IIE (Institute of International Education), que era o responsável pelo programa Ciência sem Fronteiras nos Estados Unidos.
Quais os pontos positivos do intercâmbio?
A experiência do intercâmbio me surpreendeu muito. Eu fui com a visão de que iria simplesmente pegar matéria em outra universidade. E foi muito mais do que isso. Eu vou tentar listar os pontos mais relevantes.
A primeira coisa que cito é poder vivenciar outro sistema de ensino. Ficamos na nossa universidade num microambiente muito fechado. Ver como isso é feito em outra universidade, numa escala muito maior (devido ao tamanho da universidade que fui), é muito diferente. Por vezes, achamos que não temos mais identificação com determinado assunto quando, na verdade, é mesmo uma função de como isso tudo era apresentado para mim. De alguma forma, mesmo com a universidade sendo muito maior, eu me sentia mais próxima das pessoas da área que quero seguir. Os canais de comunicação eram mais abertos. Além de que a visão para com os alunos era diferente.
Outro ponto relevante é a diversidade cultural. Eu achava incrível poder ter aula em classes que incluíam pessoas de mais de 5 nacionalidades. A universidade era nos Estados Unidos, mas você acabava conhecendo um pouco de cada país, através de colegas, tutores e professores de diferentes nacionalidades, com diferentes experiências para compartilhar.
Também proporciona o melhor aprendizado no idioma. Conviver diariamente em inglês, ter aulas e precisar responder a tudo sem utilizar o português é diferente. Tinha concluído o curso de inglês pouco tempo antes de viajar, e a experiência foi muito importante no sentido de trazer verdadeira fluência na comunicação.
Por último, cito o ponto mais relevante para mim, mas que talvez seja apenas uma particularidade do Ciência sem Fronteiras. Nessa modalidade de intercâmbio, após o período letivo, os participantes eram estimulados a procurar trabalho durante o verão, em empresas ou universidades, desde que fossem na sua área de formação. Nesse processo, havia a oportunidade de estagiar por 3 ou 4 meses numa indústria ou laboratório de pesquisa de ponta. Eu fiz um estágio de 3 meses num laboratório de pesquisa do Instituto de Tecnologia de Massachusetts na área que pretendo seguir na pós-graduação, e foi a experiência mais marcante para mim. Como não estava tendo aula, podia passar todo o dia aprendendo coisas relevantes a minha pesquisa, com acesso livre aos laboratórios da universidade a qualquer hora do dia e da noite. Os pesquisadores da universidade eram muito abertos e era possível ter um contato próximo com o que eles estavam desenvolvendo, além de formar uma rede de contatos para parcerias futuras.
O que você teria feito diferente?
Eu fui para o intercâmbio com um objetivo muito especifico, inicialmente, que era de aprender em um método de ensino diferente o que era ensinado na minha área. Eu demorei um pouco a perceber que os pesquisadores estavam sempre muito disponíveis para orientar estudantes de graduação, e talvez tenha perdido alguma oportunidade de conhecer uma área de pesquisa ou até de entrar em um grupo de pesquisa durante o período letivo.
Embora tenha sido por falta de conhecimento ou até por estar acostumada com a inacessibilidade dos professores/pesquisadores no Brasil, eu acho que, se fizesse o intercâmbio hoje, teria aproveitado as oportunidades que a universidade tinha para me oferecer desde o primeiro dia.
Qual o seu conselho para alguém que deseje fazer intercâmbio nos EUA?
Eu não tenho conhecimento sobre outras modalidades de intercâmbio, como aqueles em que as pessoas viajam para melhorar o idioma ou outros em que as pessoas vão para trabalhar. Acho que poderia dar alguns conselhos para pessoas interessadas em intercâmbios acadêmicos, com possibilidade de estágio em grandes universidades da área de ciência e tecnologia.
A primeira coisa que digo: tenha um objetivo a alcançar no intercâmbio. Por que você quer fazer isso? O que acha que vai aproveitar?
Não hesite em escolher uma universidade que tenha interesse, mesmo que está seja a primeira nos rankings de melhores universidades da sua área. Se você realmente tem interesse, isso é o que conta. As universidades valorizam muito a sua motivação e dedicação, talvez mais do que seu currículo.
Em tópico análogo: não hesite em contatar um professor que trabalha com algo que lhe interessa antes ou durante o intercâmbio. Muitos professores são realmente muito abertos a novos estudantes, e talvez esteja muito interessado em dividir algo do trabalho dele. Muitas oportunidades de estágio podem nascer disso.
Por último, esteja comprometido com seu objetivo. Deixa para viajar nas férias. O intercâmbio é um período muito curto de tempo, tenta tirar o máximo proveito desse período.
No que este intercâmbio ajudou a sua vida acadêmica, pessoal e profissional?
Acho que o intercâmbio foi a melhor experiência que tive durante minha graduação. Abriu muitas possibilidades que poderiam ser para sempre desconhecidas para mim. Então, acadêmica e profissionalmente, a experiência abriu portas no sentido de me mostrar áreas diferentes de pesquisa, possibilidades de cursos e carreiras para depois da graduação e principalmente, que isso tudo poderia ser acessível para mim.
Um exemplo muito claro foi sobre minha área de pesquisa no estágio. Lá, fiz uma pesquisa na área de Biofísica Computacional, fazendo uma pesquisa de sistemas biomoleculares relacionados a doenças humanas importantes. Descobri que essa área existia durante meu semestre letivo na Universidade de Illinois, e comecei a procurar estágios na área. Acredito que nunca teria encontrado a área que mais me identifico hoje se não fosse o intercâmbio. E também não teria tido a oportunidade que tive de aprender sobre ela.
Do ponto de vista pessoal, acho que o mais marcante foram as pessoas que conheci e o que o convívio com essas pessoas acrescentou em mim. A minha visão sobre hábitos e costumes, certo e errado, normal e ‘anormal’ mudou completamente. Ficar sempre no mesmo lugar raramente faz você perceber isso. E te faz perceber que, na verdade, os conjuntos de regras sociais podem ser completamente arbitrários.
Quais os seus planos para o futuro? Pretende voltar a morar fora do país?
Eu quero muito voltar a morar fora do país. Particularmente, quero voltar para minha universidade de estágio e continuar um projeto de pesquisa com meu orientador como estudante de pós-graduação. Então, a curto prazo, pretendo fazer mestrado/doutorado nos Estados Unidos e/ou Holanda e Reino Unido, na área de física aplicada à biotecnologia e medicina, particularmente na área de Biofísica molecular, se houver oportunidade.
Porém, pretendo morar finalmente no Brasil, trazendo conhecimento aplicado a questões de saúde pública.
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